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O português é uma língua (mesmo) traiçoeira - II
Por Aurora Gomes (Professora), em 2012/01/271011 leram | 1 comentários | 276 gostam
O português é uma língua muito traiçoeira. Esta é uma frase que todos conhecemos. Na realidade, muitos de nós estão longe de saber como essa é uma verdade disfarçada de brincadeira.
Ainda em relação aos acentos gráficos, também os agudos ou circunflexos, que ajudavam a distinguir as palavras homógrafas, são suprimidos como o AO. Deste modo, será o contexto em que as palavras surgem que permitirá fazer essa distinção. Em boa verdade, não passa pela cabeça de ninguém que se ache que nas frases «Maria, para de fazer barulho» ou «Gosto de cães com pelo comprido» as formas destacadas sejam preposições (na forma simples ou contraída). Por isso, também nestes casos a simplificação permitida pelo AO mais não faz do que tornar válidas as formas que a maioria das pessoas usava na escrita. É claro que nem todas as decisões tomadas ao abrigo do AO são tão pacíficas (e tão claras) como as que foram expostas. Anda meio mundo a perguntar, sobretudo aos pobres professores de português, se a palavra pão de ló continua a usar hífenes ou se os perdeu – e eu, e as minhas colegas, respondemos que sim, que perdeu os “tracinhos” mas continua doce e leve como sempre. E embora aqui o tom seja ligeiro, na realidade, o emprego do hífen, ao abrigo do AO, parece caraterizar-se por ter muitas regras com alguma complexidade e, pior do que isso, demasiadas exceções a essas regras. Por isso, não vale a pena dramatizar porque só com o tempo conseguiremos interiorizá-las todas.
Aliás, a comprovar a ideia de que as mudanças primeiro estranham-se mas depois entranham-se, como dizia Fernando Pessoa, está a opinião de José Saramago. Quando questionado acerca da possibilidade das reedições das suas obras terem de aplicar o AO, ele respondeu que «o futuro do português que escrevemos poderia estar bastante comprometido se não houvesse este acordo. É certo que haverá por parte de muita gente uma certa relutância em escrever acto sem "c" quando até agora escrevíamos com "c". Mas o Brasil tem 200 milhões de habitantes, creio. Podemos com os nossos dez milhões impor à sociedade mundial a nossa norma por isto ou por aqueloutro. Apresentem as razões. Há aí um grupo de pessoas que respeito muito que não estão de acordo comigo. Mas creio que temos de embarcar nesse comboio mesmo que não gostemos muito. Não há outro remédio.»
E, como dizia o outro, o que não tem remédio, remediado está.

                                                          Aurora Gomes
                                                         Professora de português


Comentários
Por António Pereira (Leitor do Jornal), em 2012/08/28
Por acaso a professora não deu aulas em Lisboa, na escola secundária de Miraflores, meados da década de 90? Aulas de comunicação e difusão. Se sim, deve-se lembrar de mim, do Telmo,do Manuel, da Manuela, Rute e Andreia.

António Carlos Pereira.

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